Suplementação luminosa na cultura do trigo


Autores:

Zanandra Boff de Oliveira1, Paulo César Vargas Luz2, Ana Luíza Canto da Silva3, Alexander Nagorsny4, Eduardo Leonel Bottega1, Alberto Eduardo Knies5

Publicado em: 24/07/2025

Introdução

A oferta de luz solar varia tanto diariamente quanto conforme as estações do ano e a latitude de localização da área. Dessa forma, a suplementação luminosa é uma estratégia que contribui para que as plantas se tornem mais eficientes no processo de fotossíntese. A iluminação artificial tem sido cada vez mais utilizada, uma vez que, possibilita o aumento do fotoperíodo, possui intensidade luminosa que pode induzir ou não a floração e alongamento do caule, além de possibilitar a produção em ambiente protegido (PAUCEK et al., 2020; BIAN et al., 2018).

Nos cultivos à campo, a tendência é realizar a suplementação de luz durante a noite, juntamente com o a irrigação via equipamento pivô central (CARVALHO, 2023), porém deve-se avaliar a possibilidade de outras estratégias operacionais para aumentar o tempo de exposição à luz sobre o dossel das plantas, já que apenas no momento da irrigação este pode pequeno. Além disso, pode-se ter ganhos positivos com a suplementação luminosa em dias nublados e no período de inverno, quando a demanda por irrigação é menor no estado do RS. 

O Rio Grande do Sul é o principal produtor de trigo com 51,6% do total nacional em 2024 (IBGE, 2024). O trigo é uma cultura de inverno altamente suscetível às oscilações de tempo e clima, o que explica a variabilidade anual de produção, e se caracteriza pela consorciação com a produção de soja e de milho, cultivadas no verão (ATLAS SOCIOECONOMICO DO RS, 2024).

A intensidade luminosa tem significativa importância no crescimento e desenvolvimento da cultura, tanto na fase inicial do ciclo, para o incremento da área foliar, quanto na fase de elongação, quando a intensidade luminosa determina o número de espigas por planta e o desenvolvimento das espiguetas (SPIERTZ, 1974) e, na fase de pré-floração, que é a mais crítica a alta intensidade luminosa para a produção de grãos (MANFRON, LAZZAROTTO e MEDEIROS, 1993). Na literatura estão disponíveis resultados positivos obtidos para diversas culturas sob diferentes espectros de iluminação de LEDs: azul, vermelho e vermelho distante (NAIR et al., 2021; ETAE et al., 2020; PALMITESSA et al., 2020; DÖRR et al., 2020; YAN et al., 2018). Assim, este estudo objetiva avaliar a suplementação luminosa para a cultura do trigo em Cachoeira do Sul-RS. 

Metodologia 

O estudo foi realizado na área experimental da UFSM – Cachoeira do Sul no ano agrícola de 2024. O clima, segundo a classificação de Köppen, é subtropical (Cfa) com clima úmido e verão quente. O solo é classificado como Argissolo vermelho (EMBRAPA, 2013). A área de estudo está localizada a 30°01’13” de latitude Sul e 52°56’18” de longitude Oeste.

A semeadura da cultivar GF 2501 foi no dia 13/06/2024, sobre resíduos vegetais da cultura da soja, em Sistema de Plantio Direto utilizando-se um conjunto trator (Massey Ferguson MF4275) – semeadora (Impelforte). O espaçamento entrelinhas e cultivo foi de 0,17 m e a densidade média de semeadura foi de 330 sementes/m2.



A suplementação luminosa iniciou no 01/07/24 na fase de perfilhamento e constou de um incremento diário no fotoperíodo de 30 min nessa fase, de 45 min na fase do alongamento e de 60 min na fase de espigamento. Trabalhou-se com 5 lâmpada de diferentes espectros, sendo elas: L1 Far Red; L2 Red + Far Red; L3 Red+Blue; L4 Whrite L5 Red+Blue SG4 (Figura 1) e uma parte do experimento sem a suplementação luminosa. A área de coleta de informações foi de 1 m2, em função da limitação da área de ação das lâmpadas. A figura 2 ilustra apresenta o experimento instalado à campo, uma imagem sem (Figura 2 A) e outra com (Figura 2 B) as lâmpadas ligadas.

A adubação de base foi de 380 kg/ha da fórmula comercial 10-16-10 (N-P-K) e a adubação de cobertura foi 160 kg/ha de N, fracionada em 2 aplicações (perfilhamento e emborrachamento). O manejo fitossanitário constitui de 5 aplicações (produto comercial Fox XPro + Egeo Pleno). O monitoramento de variáveis meteorológicas ao longo do ciclo de desenvolvimento da cultura foi realizado a partir da estação meteorológica da UFSM (grupo Metos) instalada bem próximo (50 m) ao local do experimento. A partir dos dados de evapotranspiração de referência (ETo), obtidos dessa estação meteorológica e do coeficiente de cultivo - Kc (ALLEN et al., 1998), calculou-se a evapotranspiração da cultura (ETc), para a análise da demanda hídrica da cultura.

A colheita foi realizada no dia 31/10/2024 de forma manual, aonde utilizou-se uma área delimitada de 1 m2 (área de abrangência das lâmpadas) e realizou-se a coleta de todas as plantas. Após realizou-se a trilha, a limpeza e a aferição da umidade. A massa obtida em 1 m2 foi corrigida para a umidade de 13% e extrapolada para 1 hectares (kg/ha). Desta amostra, realizou-se a determinação do peso hectolítrico - PH (kg/hL). Além disso, coletou-se 4 espigas por parcela para a determinação do comprimento da espiga (cm) e peso da espiga (g).

Resultados e Discussão

As condições meteorológicas da safra 2024 foram bastante desafiadoras para cultura do trigo, principalmente, devido aos grandes acumulados de chuva (786,2 mm) distribuídos ao longo do ciclo, sendo este bem superior ao consumo hídrico da cultura, que foi de aproximadamente 300 mm. Os dias de chuva representaram 40% do período, impactando em elevada umidade relativa do ar (>80%) e em baixa disponibilidade de radiação solar (Figura 3). Segundo Manfron, Lazzarotto e Medeiros (1993), o excesso de chuvas ou irrigação e alta umidade relativa do ar, favorecem a incidência de diversas doenças.

Além disso, a temperatura do ar apresentou elevada amplitude, entre 0,0ºC e 36,5ºC, ficando fora do limiar adequado para o bom desenvolvimento e produtividade da cultura em vários dias ao longo do ciclo. O trigo por ser uma cultua de inverno no RS, tolera as baixas temperaturas, a menos que ocorram temperaturas negativas durante a floração e a formação do grão, sendo que as geadas ocorrentes após a emissão da espiga produzem esterilidade ou chochamento dos grãos. O que não foi o caso desse estudo, em que a temperaturas mais baixas prevaleceram na fase vegetativa da cultura (Figura 3). Por outro lado, temperatura muito elevadas (>25ºC), na fase vegetativa podem impactar em menor índice de ar foliar e, consequentemente, na produtividade posteriormente e, na fase reprodutiva, podem reduzir o peso de grãos (DOORENBOS; KASSAM, 1979; MANFRON, LAZZAROTTO e MEDEIROS, 1993). Condição está observada para o experimento em análise (Figura 2).

A luz solar está entre os parâmetros ambientais mais importantes que afetam a eficiência das plantas (SOLEYMANI, 2018), uma vez que, modifica as características morfológicas, anatômicas e fotossintéticas (RECHNER et al., 2016). Observa-se que nas condições da safra 2024 em Cachoeira do Sul, o número de horas de sol diárias foi bastante variável (Figura 4), diretamente relacionada ao número de dias de chuva e a presença de nebulosidade (Figura 3). Sendo crescente da semeadura a colheita, em função das condições fotoperíodicas naturais do local (latitude de 30º) e máxima de 10,7 h no final de outubro (Figura 4). 

A intensidade luminosa tem significativa importância no desenvolvimento do trigo. Desde o desenvolvimento da área foliar nos períodos que antecedem a formação das espigas, pois representa a percentagem de radiação solar que pode ser interceptada pelas folhas, e juntamente com a faixa fotossintética e a duração do período, determina o crescimento total da cultura (MANFRON, LAZZAROTTO e MEDEIROS, 1993). Durante a elongação, a intensidade luminosa determina o número de espigas por planta e o desenvolvimento das espiguetas (SPIERTZ, 1974). Dessa forma, a suplementação luminosa aplicada impactou positivamente nos componentes de rendimento avaliados (comprimento de espiga e peso de espiga), na produtividade e na qualidade do trigo (PH). Com destaque para a utilização das lâmpadas L1 e L5, cujo o incremento em produtividade foi de 30 e 40%, respectivamente, em relação a testemunha (Figura 5). 

A produtividade do trigo obtida sem a suplementação luminosa de 2.813, 2 kg/ha (Figura 5) ficou muito próxima a média do estado do RS de 2.839,0 kg/ha, divulgada pela Emater/RS (2024). Assim, os resultados desse estudo, ainda que incipientes, pois necessitam de uma análise de viabilidade econômica e operacional, demonstram potencial de utilização da tecnologia para o incremento de produtividade do trigo. Os rápidos avanços na tecnologia de iluminação levaram a uma gama de opções de lâmpadas disponíveis para a agricultura (NAIR et al., 2021). Visto que, a suplementação luminosa pode manter o fluxo de luz constante e aumentar a produtividade de plantas (BANTIS et al., 2018).

Além disso, a utilização de fontes artificiais de iluminação sobre a lavoura via pivô central, pode associar a suplementação hídrica e luminosa na mesma área, podendo gerar grandes incrementos produtivos, principalmente na lavoura de primavera-verão. Pois, o déficit hídrico, causado pela distribuição irregular das precipitações pluviais e elevada demanda evaporativa da atmosfera (ZIPPER; QIU; KUCHARIK, 2016), é o maior causador da redução na produção das culturas de primavera-verão no Rio Grande do Sul (BERGAMASCHI et al., 2004). Ainda, deve-se avaliar a operacionalização da suplementação luminosa quando se utiliza o pivô central, pois, o tempo de exposição à luz suplementar pode ser estritamente pequeno sobre o dossel das plantas (CARVALHO, 2023). 

Considerações finais

Nas condições em que o experimento de campo foi realizado, pode-se afirmar que a suplementação luminosa aumentou a produtividade do trigo, sobretudo, utilizado do espectro do vermelho e do violeta, com incremento produtivo de até 40%. 
 

1Docente do curso de Engenharia Agrícola da UFSM Cachoeira do Sul – RS e do mestrado profissional em Agricultura de Precisão do Colégio Politécnico da UFSM, Santa Maria – RS

2Docente do curso de Engenharia Elétrica da UFSM Cachoeira do Sul – RS

3Acadêmica do curso de Engenharia Agrícola, UFSM Cachoeira do Sul – RS

4Graduado no curso de Engenharia Elétrica, UFSM Cachoeira do Sul – RS

5Docente do curso de Agronomia da Uergs unidade Cachoeira do Sul – RS

Referências

ALLEN, R. G.; PEREIRA, L. S.; RAES, D.; SMITH, M. Crop evapotranspiration - Guidelines for computing crop water requirements. Roma: FAO, 1998. 300 p. (Irrigation and Drainage Paper, 56). Disponível em: http://www.fao.org/docrep/X0490E/X0490E00.htm. Acesso em: 06 set. 2024.

ATLAS SOCIOECONOMICO DO RS. Trigo: o Rio Grande do Sul é o maior produtor de trigo no Brasil. Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão, ed.8, novembro de 2024. Disponível em: https://atlassocioeconomico.rs.gov.br/trigo. Acesso em: 21 fev. 2025.

BANTIS, F.; SMIRNAKOU, S.; OUZOUNIS, T.; KOUKOUNARAS, A.; NTAGKAS, N.; RADOGLOU, K. Current status and recent achievements in the field of horticulture with the use of light-emitting diodes (LEDs). Scientia Horticulture, v. 235, p. 437-451, 2018. https://doi.org/10.1016/j.scienta.2018.02.058.

BERGAMASCHI, H. et al. Distribuição hídrica no período crítico do milho e produção de grãos. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.39, p.831-839, 2004.

BIAN, Z.; JIANG, N.; GRUNDY, S.; LU, C. Uncovering LED light effects on plant growth: New angles and perspectives – LED light for improving plant growth, nutrition and energy-use efficiency. Acta Horticulturae, n. 1227, p. 491-498, 2018. https://doi.org/10.17660/ActaHortic.2018.1227.62.

CARVALHO, P. A. Suplementação artificial de luz na cultura do milho. 2023.120 f. Tese (Doutorado em Ciências) - Universidade Federal de Viçosa Fitotecnia, Minas Gerais, 2023. 

DOORENBOS, J., KASSAM. AH. Efectos del agua sobre el rendimiento de los cultivos. Roma: FAO, 1979. 212 p. (FAO. Riego y drenage, 33)

DÖRR, O. S.; BREZINA, S.; RAUHUT, D.;MIBUS, H. Plant architecture and phytochemical composition of basil (Ocimum basilicum L.) under the influence of light from microwave plasma and high-pressure sodium lamps. Journal of Photochemistry and Photobiology B: Biology, v. 202, n. 111678, 2020. https://doi.org/10.1016/j.jphotobiol.2019.111678.

EMBRAPA. Sistema brasileiro de classificação de solos. 3. ed. Brasília, DF: Editora Embrapa, 2013. 
ETAE, N.; WAMAE, Y.; KHUMMUENG, W.; UTAIPAN, T.; RUANGRAK, E. Effects of artificial light sources on growth and phytochemicals content in green oak lettuce.  Horticultura Brasileira, v. 38, n. 2, 2020. https://doi.org/10.1590/S0102053620200213.

IBGE. Em setembro, IBGE prevê safra de 295,1 milhões de toneladas para 2024.Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/41594-em-setembro-ibge-preve-safra-de-295-1-milhoes-de-toneladas-para-2024. Acesso em: 21 fev. 2025.

MANFRON, P.A., LAZZAROTTO, C., MEDEIROS, S.L.P. Trigo – Aspectos agrometeorológicos. Ciência Rural, Santa Maria, v. 23, n.2, p.233-239, 1993.

PALMITESSA, O. D.; LEONI, B.; MONTESANO, F. F.; SERIO, F.; SIGNORE, A.; SANTAMARIA, P. Supplementary Far-Red Light Did Not Affect Tomato Plant Growth or Yield under Mediterranean Greenhouse Conditions. Agronomy, v. 10, n. 12, 2020. https://doi.org/10.3390/agronomy10121849.

PAUCEK, I.; PENNISI, G.; PISTILLO, A.; APPOLLONI, E.; CREPALDI, A.; CALEGARI, B.; SPINELLI, F.; CELLINI, A.; GABARRELL, X.; ORSINI, F.; GIANQUINTO, G. Supplementary LED interlighting improves yield and precocity of greenhouse tomatoes in the Mediterranean. Agronomy, v. 10, n. 7, 2020.https://doi.org/10.3390/agronomy10071002.

RECHNER, O.; NEUGART, S.; SCHREINER, M.; WU, S.; POEHLING, H. M. Different narrow-band light ranges alter plant secondary metabolism and plant defense response to aphids. Journal of Chemical Ecology, v.42, n.10, p.1-15, 2016.  https://doi.org/10.1007 / s10886-016-0755-2.

SOLEYMANI, A. Corn (Zea mays L.) yield and yield components as affected by light properties in response to plant parameters and N fertilization. Biocatálise e Biotecnologia Agrícola, v. 15, p. 173-180, 2018. https://doi.org/10.1016/j.bcab.2018.06.011.

YAN, W.; ZHANG, Y.; ZHANG, Y.; CHENG, R.; ZHANG, Y.; YANG, Q.; LI, T. Effects of Supplementary Artificial Light on Growth of the Tomato (Solanum lycopersicum) in a Solar Greenhouse. The Horticulture Journal, v. 87, n. 4, n. 516-523, 2018.  https://doi.org/10.2503/hortj.OKD-165

SPIERTZ, J. H. K. Grain growth and distribution of dry matter in the wheat plant as influenced by temperature, ligth energy and ear size. Netherlands Journal of Cultural Science, Wageninger, v. 22. p. 207-20, 1974.

ZIPPER, S. C.; QIU, J.; KUCHARIK, C. J. Drought effects on US maize and soybean production: spatiotemporal patterns and historical changes. Environmental Research Letters, v.11, 094021, 2016. Available from: <https://iopscience.iop.org/arti