Gianlucca Pigatto1, Zanandra Boff de Oliveira2; Alberto Eduardo Knies3
Introdução
A soja, principal cultura de verão do Rio Grande do Sul, tem a sua variabilidade anual de produtividade associada a distribuição hídrica de cada ano agrícola. O El Niño Oscilação Sul (ENOS) é a principal causa da variabilidade interanual de precipitações pluviais no estado. A fase quente (El Niño), apresenta chuvas acima da média climatológica para a região sul do Brasil, enquanto a fase fria (La Niña) apresenta chuvas abaixo da média climatológica, especialmente, na primavera-início de verão do ano de início do fenômeno (FONTANA; BERLATO, 1995). O RS este sob a influência da Lã Niña nas últimas três safras (2020-21, 2021-22 e 2022-23), impactando significativamente na redução da produtividade das culturas de primavera-verão, em regime de sequeiro.
Os prejuízos do déficit hídrico sobre o rendimento na cultura da soja dependem da intensidade, duração e época de ocorrência, além da sensibilidade da cultivar, destacando o período reprodutivo como o mais crítico (NEUMAIER et al., 2020). No RS é frequente ocorrer déficit hídrico durante o período crítico da soja, podendo ocorrer redução da produtividade em nove a cada vinte safras (MATZENAUER et al.; 2003). Silva et al. (2020) destaca que o déficit hídrico é o principal fator de quebra de produtividade da cultura da soja no Brasil.
Assim, a irrigaçã
Metodologia
O experimento foi realizado na Estação Experimental da Uergs, localizada no distrito de Três Vendas, no município de Cachoeira do Sul (29º53’ S e 53º 00’ W, altitude de 125 m), na região central do estado. Segundo Köppen, o clima predominante da região é definido como subtropical úmido (Cfa), predominante na região sul. O solo da área experimental foi classificado como Argissolo Vermelho distrófico típico (EMBRAPA, 2013).
O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso no esquema fatorial (2 x22), sendo o fator “A” dois regimes hídricos (irrigado e sequeiro) e o fator “B” 22 cultivares de soja e três repetições, totalizando 132 parcelas experimentais. As 22 cultivares de soja foram escolhidas em função da disponibilidade (doação de sementes) e estão apresentadas com seus respectivos GMR na Tabela 1 e uma visão geral do experimento pode ser observada na Figura 1.
A semeadura foi realizada no dia 26/11/2022, dentro do período recomendado pelo zoneamento agrícola de risco climático para a cultura (ZARC), utilizando um conjunto trator (Massey Ferguson MF4275) – semeadora (Massey Ferguson MF 407, 7 linhas), utilizando o sistema de plantio direto sobre a palhada do trigo. O espaçamento entre linhas utilizado foi de 0,5 metros, contendo 14 plantas por metro linear, perfazendo a densidade de semeadura de 310.000 plantas por hectare. O manejo e os tratos culturais, seguiram as recomendações agro
Resultados e Discussão
A baixa quantidade de chuvas e a distribuição irregular delas o longo do ciclo de desenvolvimento da soja (Figura 2), impactaram em redução na disponibilidade hídrica do solo, evidenciada pela CAD de sequeiro que esteve sempre abaixo do limite de depleção estabelecido, indicando a elevada magnitude do déficit hídrico. Os valores acumulados de chuvas ao longo do ciclo foram de apenas 151 mm, sendo necessários mais 294 mm via irrigação suplementar para suprir a demanda hídrica da cultura e manter o armazenamento de água no solo dentro do limite estabelecido (entre a CAD e a CAD no limite de depleção).
Os impactos positivos da irrigação foram observados no estabelecimento e crescimento das plantas (Figura 3 A e B), nos componentes de produtividade (Figura 3 C e D e Figura 4) e na produtividade da soja (Figura 4).
O único componente de rendimento que não foi beneficiado pela irrigação foi o número de grãos por vagem, segundo Mundstock; Thomas (2005), este é um componente ligado diretamente a genética da cultivar. Para os demais, o ganho médio com a irrigação foi de um incremento de 114% (49 vagens) no número de vagens por planta e de 30% (40 g) na MMG, que impactaram em 111 % a mais na produtividade da soja, ou seja, 2246,6 kg/ha (Figura 4). Oliveira et al. (2021 a), no mesmo local da realização deste estudo e época de semeadura similar (safra 2019-20) observaram incremento de 1912, kg/hana produtividade da soja com 129 mm de irrigação. Déficits hídricos expressivos, conforme o demonstrado neste estudo (Figura 2), provocam alterações fisiológicas na planta de soja que em fase de floração podem gerar como consequência a queda prematura de flores ocasionando abortamento de vagens (TAIZ; ZAIGER, 2013), condição demostrada na Figura 3 D .Correa et al. (2019), observaram que a irrigação por aspersão promoveu aumento na MMG na média das cultivares em estudo, em torno de 20 g em relação ao tratamento sem irrigação, corroborando com os resultados obtidos (Figura 4).
A produtividade da soja irrigada foi de 3206,6 a 5195,4 kg/ha e a de sequeiro de 1527,6 a 2617, 9 kg/ha (Figura 5). A cultivar BMX Compacta foi a mais responsiva a irrigação com um incremento de 2,15 vezes na produtividade e a cultivar BMX Vênus a menos responsiva, com um incremento de 0, 6 vezes.
A produtividade (Figura 6) média da soja irrigada no grupo “A” das cultivares mais produtivas foi de 5043,1 kg/ha, no grupo “B” foi de 4492,8 kg/ha, no grupo “C” foi de 4138,9 kg/ha e no grupo “D” foi 3507,1 kg/ha. Já no sequeiro, teve uma menor variabilidade na produtividade entre as cultivares, sendo divididas em dois grupos. As cultivares do grupo “A” apresentaram a produtividade média de 2348,6 kg/ha e o grupo “B” de 1790 kg/ha. Portanto, são diferenças expressivas de produtividade entre cultivares para um mesmo regime hídrico. Assim, a escolha adequada da cultivar em função do tipo de manejo e nível tecnológico empregados na área é de fundamental importância para maximizar a produtividade da soja.
Optar por cultivares precoces (menor GMR), que apresentaram elevadas produtividades (Figuras 5 e 6), pode trazer benefícios ao sistema produtivo da propriedade, com a possibilidade de realizar uma safrinha ou de trabalhar com plantas de cobertura antes da semeadura de inverno, enfim, é um resultado que contribui para a tomada de decisão. Oliveira et al. (2021 b) destacaram que cultivares de ciclo mais precoce (GMR 5.0 e 4.8), apresentaram produtividades mais elevadas sob irrigação em dois anos agrícolas 2018-19 e 2019-20.
Considerações finais
A escolha de uma cultivar de soja baseada em dados de produtividade obtidos na região, associada a prática da irrigação, pode incrementar mais que o dobro da produtividade da soja em anos de baixa disponibilidade hídrica como o de 2022-23.
1 Estudante do curso de Engenharia Agrícola, UFSM Cachoeira do Sul – RS
2 Professora do curso Engenharia Agrícola da UFSM Cachoeira do Sul – RS e do Mestrado Profissional em Agricultura de Precisão do Colégio Politécnico da UFSM, Santa Maria – RS
3Professor do curso de Agronomia da Unidade da Uergs Cachoeira do Sul - RS
Referências
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